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Escrito por André Costa, andre.costa@svm.com.br
Jornal Diário do Nordeste
Quem é o homem por trás do Padre considerado santo pela comunidade católica? Padre Cícero Romão Batista, o Padim, como carinhosamente é chamado pelos romeiros, tem sua trajetória religiosa conhecida por muitos, mas, alguns episódios, não são tão conhecidos, como sua relação com Lampião, o mais famoso cangaceiro da história.
Historiadores que se debruçaram sobre a trajetória de vida do Padim apontam que ele tinha "cordial relacionamento" com Lampião, que, à época, amedrontava as pequenas cidades do Nordeste com seu bando - dentre algumas exceções, Crato, cidade natal de Padre Cícero.
Essa relação teria tido seu nascedouro no final dos anos 1920 e início dos anos 30, quando o governo Federal teria pedido para que Padre Cícero negociasse o apoio de Lampião e seus homens para conter a 'Coluna Prestes', movimento político-militar ao qual o cangaceiro e suas tropas estava inclinado a apoiar.
Mas, por qual motivo Padre Cícero seria imbuído de tal negociação? As respostas não são consenso entre os pesquisadores. O fato é que alguns livros abordam a influência que o Padim detinha sobre as populações sertanejas nordestinas, por seu carisma e a fama de "Santo" que já corria por entre os sertões.
PhD em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), o historiador pernambucano José Ferreira Júnior conta que Lampião, em que pese seus incontáveis crimes praticados, considerava-se um cristão e, assim como tantos outros milhares de sertanejos, reverenciava Padre Cícero. Por conta desse prestígio, o religioso teria sido considerado o melhor nome para "negociar" com o cangaço.
Sua retórica e veia política o credenciavam ainda mais para a missão. Além de religioso, Padre Cícero foi prefeito - e fundador - de Juazeiro do Norte, vice-governador do Estado e deputado federal (estes dois últimos cargos não exerceu). Ter Lampião sob controle, como forma de apaziguar os ânimos dos coronéis, faria crescer ainda mais seu prestígio.
O especialista relata em sua tese de mestrado, “Religião no Cotidiano Cangaceiro; representações e práticas”, que Cícero aceita o pedido do governo e retransmite a proposta a Lampião, que prontamente teria aceito. José Ferreira Júnior conta, em um de seus textos sobre a vida do Padre Cícero que, em 1926, Lampião teria ido a Juazeiro do Norte receber a patente de capitão das forças patrióticas - o ato fazia parte do acordo com o governo.
Os bandidos, ajoelhados, teriam escutado o Padre tentar convencer seu líder de largar o cangaço logo após voltasse da campanha contra Prestes. Mandou-se então chamar o único funcionário federal disponível na cidade, o agrônomo Pedro de Albuquerque Uchoa, para redigir um documento que, supostamente, garantiria salvo-conduto ao bando pelos sertões.
Mais armado e com mais dinheiro, o cangaceiro seguiu atacando localidades, todas elas, distantes de onde Padre Cícero exercia sua influência e prestígio. A saga aterrorizadora de Lampião só chegaria ao fim em julho de 1938, quando ele é assassinado, juntamente com sua esposa Maria Bonita, e outros nove comandados. Padre Cícero morreu cinco anos antes.
A relação entre o mais famoso cangaceiro e o mais notável religioso nordestino foi mítica, assim como a trajetória desses dois personagens. O fato - ao que contam historiadores e pesquisadores - é que Lampião e Padre Cícero teriam ficado frente a frente apenas uma vez, em 1926.
Ali estavam, frente a frente, pela primeira e única vez, os dois maiores mitos de toda a história nordestina.
Esse encontro, no entanto, não "mancha" a trajetória sacerdotal do Padre Cícero. O também sacerdote e professor universitário, padre Abimael Francisco do Nascimento, reconhece a relação entre as duas figuras nordestinas, mas avalia que esses episódios folclóricos fazem "recair sobre Padre Cícero más interpretações".
Escrito por André Costa, andre.costa@svm.com.br
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